segunda-feira, 8 de junho de 2009

Um barco na garrafa pronto pra velejar

No sábado eu tomava uma cerveja no Sapão Taioba e, não me recordo bem porquê, Andrezza e eu nos recordamos de Some Devil, disco solo do senhor David John Matthews de 2003. Não me lembro de ter lido muito a respeito à época. Se não me engano, o álbum, exatamente por ser solo, traz o Dave revendo sua vida todinha, fatos e certezas. Fica claro na capa: Matthews olha pra trás por sobre o ombro direito, com um título que, não sei se li ou se interpreto, tem a ver com a constante titubeação do sujeito que tem fé: contra a certeza de um deus há um demônio a tentar.

Sou fã do cara, mas desconheço detalhes dos fatos da vida dele. Sei que não foi fácil e que há algumas tragédias, do tipo mesmo que não acontece com todo mundo, como a irmã morta pelo marido. No disco há memórias de um acidente de carro, em So damn lucky; tem memórias de outros, em Gravedigger, que tem um tom Bartender com Don't drink the water, como homenagens póstumas. Nessa Gravedigger tem uns versos que acho sublimes: quando Matthews trata do pequeno Mike Carson, morto aos 8 anos, ele usa os verbos dos versos a seguir no presente, como se os sonhos do pequeno Mike, que eram tudo o que ele tinha, permanecessem vivos, antes que ele pudesse realizar qualquer coisa. É de partir o coração. Tem Save me, que tem bem a cara do crente em conflito, com uma levada blues muito bacana.

É dos álbuns de que não me canso nunca e que sempre me parece ter coisa pra descobrir. E entre tantas memórias, algumas certamente doloridas, há uma recomendação nos versos de Baby que, embora melancólica, tá sempre na minha cabeça, por guardar uma correspondência com o que penso dessa vida: seja um barco pronto pra velejar mesmo que esteja dentro duma garrafa.